Eu não era diferente
Pt.1
Eu me sentia feliz.
Extremamente completa e não desejava absolutamente nada. Eu pensava que era o bastante pra mim mesma, totalmente intransitiva. Eu achava que a minha vida era perfeita do jeito que estava, não tinha problemas. Não tinha nada com que me preocupar. Não precisava chorar com a partida de alguém e nem esperar que voltasse. Pois, afinal, eu não tinha ninguém.
Além do mais, eu não precisava de ninguém e ninguém precisava de mim. Ótimo. Tudo o que todas as pessoas reclamavam que faltava na suas vidas eu tinha de sobra: TEMPO.
Mas o que uma pessoa que tem todo o TEMPO do mundo podia fazer?
Pergunta fácil pra eu responder, já que eu era essa pessoa. Eu lia. Eu lia muito. Eu lia tudo. Eu também ouvia. Eu ouvia muito. Eu ouvia tudo. E, principalmente, eu aprendia.
Eu aprendi tudo o que minha mente podia ser capaz de interpretar. Eu aprendi das mais imensas fórmulas da física até a mais complexa das sinfonias. Eu precisava preencher meu tempo e eu tinha uma constante sede de conhecimento.
Até que um pequeno livro me chegou às mãos.
A capa era simples. Preta e branca. Duas estatuas de pedra se olhando, uma tocando o rosto da outra. Pensei que seria algo totalmente insignificante, mas como tinha TEMPO sobrando, abri.
Não era um livro comum. Percebi que era um tipo de peça teatral. Algo para ser interpretado. Mesmo assim fui lendo pagina após pagina. Fui me encantando com cada palavra, com cada frase. Até que uma passagem me chamou mais a atenção do que as outras.
“Amor é uma fumaça que se eleva com o vapor dos suspiros; purgado, é o fogo que cintila nos olhos dos amantes; frustrado, é oceano nutrido das lágrimas desses amantes. O que mais é o amor? A mais discreta das loucuras, fel que sufoca, doçura que preserva”.
Depois de ler esse trecho me pus a pensar o que era isso que tal autor descrevia com tanto furor. Nunca tinha lido nada parecido. Os outros livros me ensinavam teorias, números e artes complexas, mas isso era novo.
Sem entender continuei lendo e descobrindo mais coisas que jamais me foram apresentadas.
Paixão? Amor? Sentimentos?
Tudo parecia tão intenso, tão abrasador. E para mim era tudo tão inusitado. Como uma coisa assim poderia acontecer entre duas pessoas? Não poderia ser possível. As pessoas que conheci não possuíam tal dom, eram tão frias. Estava tudo tão destruído, tudo sem vida. Será?! Uma criatura viva disposta a morrer pela outra?!
No meu mundo isso é impossível. Todos existem pra si próprios, ninguém convive com outro da mesma espécie. No meu mundo a única palavra de ordem é medo. O único (sentimento?) que as pessoas cultivam é o ódio.
Mas amor? Como eu nunca havia ouvido sobre isso? Parecia uma coisa tão nobre. Tão boa?! E pela primeira vez eu senti um pequeno fio de esperança guiando minha existência.
No meu mundo as pessoas eram guiadas pelo dinheiro, pelo poder. Só pensavam em si e eu não era diferente. Até agora.
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